segunda-feira, 15 de junho de 2015

Ingestão de proteínas e saúde renal


Quando comecei a treinar, há cerca de 20 anos, sempre ouvia praticantes mais experientes dizendo que para aumentar a massa muscular era preciso comer muita proteína. Resolvi seguir a dica e, realmente, tive bons resultados. Quando introduzi os suplementos em minha alimentação (mesmo sem um adequado acompanhamento profissional) tive resultados ainda melhores, o que me levou a acreditar que uma dieta rica em proteínas era mesmo o grande segredo para a hipertrofia muscular.
   
Empolgado, passei a comer grandes quantidades de proteínas, afinal, na minha cabeça de adolescente, quanto mais, melhor. Só que a partir de um determinado ponto, as únicas coisas que aumentaram foram a minha gordura corporal e a formação de gases.
   
Essa experiência me levou a pesquisar e estudar o assunto, o que não foi fácil, pois, na época, a internet apenas "engatinhava" no Brasil. Pela leitura de artigos, revistas e livros especializados, descobri que o processo não era tão simples quanto eu imaginava, e, pior, vários livros alertavam que a ingestão excessiva de proteínas poderia causar danos à saúde, principalmente à saúde renal. Fiquei preocupado, claro, mas continuava sem entender como é que os atletas de bodybuilding conseguiam manter uma alta ingestão de proteínas, bem acima da recomendada, e, aparentemente, estavam todos com a saúde em ordem. Afinal, qual seria o segredo?
   
Decidi ir a uma 
nutricionista para esclarecer minhas dúvidas e ela garantiu que se eu continuasse ingerindo tanta proteína, meu fígado e meus rins não suportariam tal sobrecarga. Saí da consulta assustadíssimo, pois, não somente os rins, mas também o meu fígado seria comprometido! É importante lembrar que naquele tempo era muito difícil encontrar profissionais especializados em nutrição esportiva.
   
Fiz questão de contar essa história porque, passados todos esses anos, houve uma evolução estrondosa no mercado da suplementação alimentar, com incontáveis produtos nas prateleiras, mas as dúvidas aparentemente continuam as mesmas. Se naquela época a preocupação era se albumina em excesso fazia mal, hoje a dúvida é se a ingestão das inúmeras opções de suplementos proteicos pode sobrecarregar o fígado e os rins.
   
Analisando os estudos - sérios - sobre ingestão proteica e saúde renal, podemos constatar que não é possível estabelecer uma relação direta entre uma ingestão elevada de proteínas e o prejuízo na saúde renal de indivíduos saudáveis. O fato de a restrição proteica ser uma das principais medidas no tratamento dietoterápico em doentes renais, não significa que a mesma regra valha para todos.  Já foram feitos inúmeros estudos e ainda não há evidências suficientes que comprovem que a alta ingestão de proteína possa causar danos renais em indivíduos saudáveis, que possuem um funcionamento normal dos rins.
  
 Algumas explicações para a possível relação entre alta ingestão de proteína e dano renal são de que, como os rins eliminam os produtos do metabolismo (como ureia e amônia), o consumo elevado de proteína pode aumentar a taxa de filtração glomerular, causando aumento da pressão dentro dos glomérulos e prejudicando a função renal progressivamente. Também pode haver sobrecarga do fígado, por ser o órgão responsável pela metabolização de aminoácidos. Hoje sabemos que essas alterações são adaptações fisiológicas normais do organismo humano, dentro de um limite da capacidade renal, mas vale ressaltar que os estudos já realizados consideraram uma ingestão proteica até cerca de 3 gramas/kg, ou seja, ainda não existem estudos sobre impacto na saúde renal de ingestões proteicas mais elevadas, a curto, médio e longo prazo.
   
Relaciona-se também a ingestão proteica com perda de massa óssea. No entanto, isso pode ser verdade para indivíduos susceptíveis, por exemplo, mulheres sedentárias no período pós-menopausa, mas não para indivíduos fisicamente ativos e/ou engajados em treinamento com pesos.
   
Só que antes de acrescentar mais medidas de whey protein em seu shake, é fundamental saber se existe demanda para esse aumento no consumo, pois uma ingestão desnecessária de proteínas pode causar acúmulo de gordura corporal, contribuindo para o desenvolvimento da aterosclerose e doenças cardíacas. Além disso, uma alimentação com altas concentrações de proteínas pode limitar a ingestão de outros nutrientes essenciais, necessários para o organismo suprir a quantidade energética diária.
   
Se é assim que funciona por que bodybuilders de alto nível, em algumas fases da periodização do treinamento, reduzem os carboidratos e ingerem ainda mais proteína?
   
Nas semanas que antecedem uma competição, bodybuilders experientes utilizam diversas estratégias nutricionais, algumas pouco convencionais e não recomendadas. Só que esses atletas não comem muita proteína pensando só no crescimento muscular, mas também para acelerar a perda de gordura. Com a ingestão controlada de carboidratos, associada a uma ingestão proteica elevada, ocorre um processo em nosso organismo chamado gliconeogênese (conversão de proteína em glicose). Esse processo apresenta um alto custo metabólico, ou seja, se gasta mais calorias para metabolizar a proteína como fonte energética.
   
Em qualquer esporte de alto nível é comum observarmos medidas pouco saudáveis (perda abrupta de peso, excesso de treinamento, recuperação inadequada de lesões, etc), mas muitas vezes necessárias para a busca de um bom resultado em competições. No entanto, estamos falando de atletas de alto nível, pessoas experientes e com grande supervisão profissional, e não de pessoas comuns que buscam a nutrição e o exercício físico para terem um corpo harmonioso e saudável por toda a vida.
   
Considero que uma alimentação rica em carboidratos e gorduras, somada ao sedentarismo, é muito mais prejudicial à saúde renal do que uma ingestão proteica um pouco acima da recomendada. A obesidade, a hipertensão arterial e o diabetes, são conhecidos fatores de risco para doença renal crônica. A ingestão proteica ideal irá depender de diversas características individuais e da fase de treinamento em que o indivíduo se encontra. Portanto, consulte sempre um 
nutricionista esportivo e respeite a sua individualidade biológica.