Não tenho a intenção de participar da polêmica, mas acredito
que preciso me posicionar sobre este tema para que vocês, que seguem meu
trabalho, saibam o que penso sobre ele.
O leite é um produto consumido pelos seres humanos há
relativamente pouco tempo. Tudo indica que começamos a utilizá-lo há algo em
torno de 10.000 anos. Parece muito tempo mas, em termos evolutivos, é um pouco
antes de ontem. Acredita-se que contribuiu positivamente para nosso
estabelecimento em povoados, com a criação dos rebanhos, diminuindo nossa
necessidade de viagens de caça. Beleza. Parece que ajudou muito.
Desconsiderando, agora, estas questões evolutivas, muita
gente briga por causa do leite. Desde pesquisadores renomados até curiosos de
outras áreas do saber, muita gente opina sobre ele. Há muito tempo eu busco
alcançar uma idéia concreta sobre isso e vou colocar ela pra vocês aqui. Eu costumo
pedir aos meus pacientes que não utilizem o leite em geral, mas não crio
restrições aos derivados desde que o paciente não apresente problemas
específicos com seu consumo.
Quando falo do leite, estou me referindo, especificamente,
ao leite de vaca. Este é o mais consumido mundialmente e sobre ele recai nossa
busca por entendimento. Este produto animal tem uma composição nutricional bem
interessante. Em um copo de 200ml temos, aproximadamente, 10g de açúcares, 6g
de proteínas, 6g de gorduras (sendo 2,4g de gorduras insaturadas e, na fração
das saturadas, boa parte em ácidos graxos de cadeia curta e média) e 1,4g de
minerais diversos. Desta "secreção nutritiva" são feitos os mais
diversos produtos, como manteiga, queijos, iogurtes, coalhadas, suplementos
alimentares e creme de leite. Pronto. É disso que estamos falando e
considerando, fundamentalmente, o leite de vacas criadas A PASTO E SEM RAÇÕES
ESQUIZOFRÊNICAS BASEADAS EM GRÃOS E ADITIVOS MINERAIS. É um produto, sem
dúvida, nutricionalmente denso, mas isso não o torna ideal para o consumo
humano.
Observe, por exemplo, uma coisa muito importante: NÃO EXISTE
ALERGIA A LACTOSE. A lactose é o açúcar existente no leite. É um dissacarídio
composto pela associação entre 1 molécula de glicose e 1 molécula de galactose.
Sendo um açúcar, não há como criarmos alergia a ela. O que ocorre, no que se
refere à lactose, é que uma pequena fração das pessoas não possui a enzima
necessária para realizar a digestão da lactose. Esta enzima se chama lactase.
Estas pessoas sentem-se muito mal ao consumir leite, podendo apresentar uma
série de sintomas como gases, indigestão, dores de cabeça, dores abdominais,
vômitos e diarréia. Enquanto crianças, a maioria das pessoas apresenta uma
quantidade boa e eficiente de lactase mas, quando atingem a vida adulta, a
maior parte destas pessoas muda de uma boa quantidade de lactase mais eficiente
para uma menor quantidade de lactase menos eficiente, o que significa que quase
todos os adultos vão ter ALGUM GRAU de intolerância à lactose, o que não
significa doença, mas pode causar sintomas menores. Isso explica o porquê de
grande parte das pessoas se beneficiar de uma dieta com restrição de lactose.
Vale lembrar que os leites ditos "sem lactose"
nada mais são do que leite comum tratado com lactase, ou seja, leite com
glicose e galactose. Continua tendo açúcar e, portanto, não é adequado nem para
uma dieta Low-Carb nem para uma Paleo ou Primal.
O que pode, de fato, causar alergias ou, de outras maneiras,
ser imunogênicas, são as proteínas do leite. Ricas em aminoácidos de cadeia
ramificada (BCAA), tanto a lactoalbumina (do soro do leite) quanto a caseína
(da parte sólida) são proteínas de alto valor biológico. A caseína costuma
existir em 2 formas, a A1 e a A2, sendo a forma A1 a verdadeiramente
problemática. Quando se quebra, no estômago, a forma A1 gera um subproduto
conhecido como CASEOMORFINA, um opióide, que tem efeitos viciante e de
alteração de comportamento e parece estar relacionado com a piora do autismo.
As vacas holandesas, por exemplo, geram leite com 50% de fração A1, as Jersey
25% e o Gir leiteiro gera leite com quase totalidade de caseína A2, sendo muito
melhor para o consumo humano. Na Nova Zelândia e na Austrália estes fatos já
são considerados e é incentivada a produção do leite com caseína A2 havendo,
inclusive, um certificado para ele. Na Nova Zelândia e na Austrália...
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Gir Leiteiro - esse é do bão!
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Considerando todos estes fatos, consumir leite do gado
correto, criado A PASTO, SEM RAÇÕES ESQUIZOFRÊNICAS, pode não ser tão ruim. Eu
ainda prefiro utilizar apenas os derivados, principalmente nas suas versões
integrais, pois a retirada da lactose da alimentação tem se mostrado benéfica
na maioria dos casos. Ainda não temos como ter certeza sobre qual caseína
estamos ingerindo, aqui no Brasil. Espero que, um dia, isso mude.
Pra terminar, aproveito fragmentos do texto do Dr Souto,
cujo link postei
no FaceBook também:
Dairy and Cardiovascular Disease: A Review of Recent
Observational Research
(...)This was in contrast to the findings reported from a
prospective study of Caucasian American adults in which it was observed
that women who reported “nearly daily” low-fat cheese and fat-free milk
consumption had an increased incidence of CHD compared to those who reported
“rarely/never” consuming low-fat cheese and fat-free milk.This was a
surprising observation in light of the fact thatthere was no significant
association between total dairy intake and risk of CHD in this
population. The results of these studies indicate the complexity of dairy
foods and the differences in CVD risk depending upon the type of dairy food
consumed. Whereas total dairy and cheese reportedly had inverse
relationshipswith CVD risk, butter (as a spread) was associated with
disease but total butter consumption was not.
Tenho vontade de gritar. Sacudir os pesquisadores pela
lapela. Parece que os dados precisam de uma melancia pendurada no pescoço para
serem notados!! Resumindo o texto acima:
1) O consumo diário de laticínios DESNATADOS está associado
a doenças cardiovasculares;
2) Laticínios com gordura e queijo são inversamente associados
com doença cardiovascular (ou seja, quanto mais se consome, MENOS doença
cardiovascular se tem);
3) Manteiga, quando usada para espalhar no pão, está
associada com doença cardiovascular;
4) Manteiga, de uma forma geral, não está associada
com doença cardiovascular.
Até agora, portanto, prefiro que você use queijos, iogurtes,
creme de leite e manteiga, mas evite o leite. Quem sabe, com o tempo, a
humanidade utiliza seu poder transformador para aproveitar esta interessante
matriz alimentar de uma forma mais adequada, talvez através de manipulações
genéticas ou de tratamento do leite de alguma maneira. Vamos ver. AINDA tenho
alguma esperança nos homens.
Vamos em frente, transformando.
Aproveite para ler o excelente blog http://www.paleodiario.com/!
Dr Adolfo Duarte - CRM-BA 15.557